terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

ALTA PROGRAMADA

Juiz concede antecipação de tutela para que INSS cesse prática ilegal de suspensão de benefício previdenciário

(*) Luiz Salvador

É fato de todos conhecido que o INSS vem concedendo benefício auxílio-doença comum (B-31), ao invés do acidentário (B-91), razão do propalado déficit anunciado na concessão do benefício auxílio-doença comum, que o levou a adoção das “altas programadas”, também denominada “Data de Cessação de Benefício DCB”.

Para saber mais sobre “Alta Programada e Data de Cessação de Benefício DCB”, leia nosso artigo intitulado: “COPES - ALTA PROGRAMADA AGORA SE CHAMA DCB - DATA DE CESSAÇÃO DO BENEFÍCIO”, publicado na Revista Consultor Jurídico, www.conjur.com.br, link: http://www.conjur.com.br/2006-jul-31/alta_programada_serve_inss_reduzir_custos?pagina=3

A razão de todos esses procedimentos está a necessidade de contenção na concessão de auxílio-doença que passaram de 950 mil em janeiro de 2003 para 1,6 milhões em outubro de 2005. Se continuasse no mesmo ritmo acelerado o número de auxílio-doença concedidos estaria na casa dos 2,2 milhões anualmente. As medidas adotadas estabilizaram as concessões que em junho de 2007 somavam 1.3 milhões
(Jornal O Estado do PR, 10.08.08).

Mas quem paga os ônus dessa política viciada é o próprio segurado infortunado ao não ter assegurado o benefício auxílio-doença acidentário (B-91), percebendo, quando muito o benefício auxílio doença-comum (B-31), acompanhado no geral das repudiadas “altas programadas”.

De todos também sabido que o benefício auxílio doença-acidentário (B-91) tem fonte de custeio (SAT) financiado pelo empregador, com desconto mensal em sua folha de pagamento, de 1 a 3 por cento, dependendo de seu enquadramento de risco a encargo de fixação pelo INSS.

Em nosso entendimento, afastados os vícios conhecidos do sistema e acaso haja aplicação correta como de lei pela perícia do INSS da nova ferramenta conhecida como NTEP – Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário, que permite ao INSS conceder o benefício auxílio-doença acidentário, ainda que o empregador não emita a CAT, sem a flexibilização introduzida pela Instrução Normativa 31 que substituiu a de número 16 que adota o critério objetivo para a concessão do benefício acidentário, por certo que o propalado déficit na concessão desviada do auxílio doença-comum (B-31) seria reduzido em mais de 80%, já que consabido que mais de 80% dos acidentes são subnotificados.

O NTEP tem suporte legal na Lei 11.430/2006 que deu novo enfoque ao reconhecimento do nexo causal, passando a tratar a questão não mais do ponto de vista individual e a encargo do infortunado, mas do risco epidemiológico de cada setor da atividade econômica, catalogada no Decreto 6.042, de 12 de fevereiro de 2007, regulamentada pela IN 16/2007.

De se ressaltar que a nova Instrução Normativa INSS/PRES nº 31, de 10 de setembro de 2008IN31/2008 que substituiu a revogada IN 16 tem sua legalidade contestada pelo Ministério Público do Trabalho da 12ª Região intimando-se o INSS para que: “Proceda no prazo de 60 dias a revisão da Instrução Normativa INSS/PRES nº 31, de 10 de setembro de 2008, abstendo-se de editar instrução normativa que contrarie normas legais e conceitos jurídicos já consagrados”. (NOTIFICAÇÃO RECOMENDATÓRIA 09/2008).

Dentre os fundamentos da NOTIFICAÇÃO RECOMENDATÓRIA 09/2008 expedida ao INSS, há apontamentos dos diversos dispositivos legais que restara violados, incorrendo a IN 31 editada então em: “subversão dos princípios legais que regem os atos regulatórios, não podendo, como ocorreu, que por serem as instruções normativas atos inferiores à Lei, em sentido formal, e aos Decretos, inová-los ou contrariá-los, mas unicamente complementá-los e explicá-los, sob pena de exceder sua competência material, incorrendo em ilegalidade. (STF ADI 2.398-AgR, rel. Min. Cezar Peluso, julg. em 25.06.2007)”

A realidade dos avanços já conseguidos com a implantação do NTEP é incontestável. Bastou a entrada em vigor do Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário - a nova ferramenta que permite ao INSS reconhecer os acidentes de trabalho, mesmo sem emissão da CAT - para as estatísticas oficiais reconhecerem o acerto da medida.

O número de acidentes reconhecidos pela autarquia saltou do ano de 2006 de 512.232 acidentes com CAT emitida para um total de 653.090 acidentes reconhecidos no ano de 2007, incluindo acidentes sem CAT emitida:
2006 - Total dos acidentes: 512.232
2007 - Acidentes com CAT emitida: 514.135
Acidentes sem CAT emitida: 138.955
Total dos acidentes: 653.090

Conhecendo por certo todos esses vícios que vimos denunciando em nossos artigos e as desarrazoadas justificativas para o INSS insistir na aplicação das “Altas Programadas”, o juiz Edmilson da Silva Pimenta, da 3ª Vara Federal em Sergipe, acaba de conceder tutela antecipada, requerida pela Defensoria Pública da União, para que Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) finde com a prática da “Data de Cessação de Benefício” (DCB), ou “Alta Programada”, ficando proibido de suspender o benefício auxílio-doença antes da certeza de que findou a incapacidade laborativa do segurado.

O juiz Edmilson da Silva Pimenta atua na 3ª Vara Federal em Sergipe, sendo de se ressaltar que ao conceder a liminar postulada o magistrado determinou que seja realizado agendamento de nova perícia médica, nos casos das agências e postos do Instituto situados nos Estados que compreendem a atuação do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF 5).

A intentada é de autoria da Defensoria Pública da União que promoveu a Ação Civil Pública com o objetivo de garantir o direito à continuidade do recebimento do auxílio-doença até que seja verificada a real condição de saúde de segurado. De acordo com a Defensoria, a suspensão do benefício, decorrente da prática da “Alta Programada”, se configura em um desrespeito aos princípios da legalidade, da dignidade da pessoa humana, do contraditório e da ampla defesa, do direito à saúde e à previdência social.

Na contestação, o INSS afirmou não ser um órgão de assistência médica, dessa forma, não sendo de sua competência realizar diagnósticos, tratamentos, ou “dar alta” ao paciente, mas sim estimar prazos necessários à recuperação do segurado, com base em estudos. O réu assinalou que não há limite para a cessação do benefício, sendo este estabelecido em função das características da doença. Além disso, a interposição do pedido de prorrogação do benefício é cabível nos casos em que a DCB for maior que a Data de Realização do Exame (DRE).

Segundo Edmilson Pimenta, “para que o auxílio-doença seja suspenso ou cesse, deve ser verificado se o beneficiário encontra-se capacitado para o trabalho, através da devida perícia, o que cumpre ao INSS fazer de forma contundente e não por mera presunção”.

O magistrado completa declarando que “não prospera o argumento de que o segurado pode solicitar exame médico-pericial se não estiver apto para o trabalho ao término do prazo de duração do auxílio-doença, tendo em vista que é dever da Autarquia Previdenciária convocar o segurado para a submissão ao exame, e não o contrário”.

Leia a íntegra da sentença:“Poder Judiciário. JUSTIÇA FEDERAL. Seção Judiciária do Estado de Sergipe. Processo nº 2008.85.00.002633-8. Ação Civil Pública: 2008.85.00.002633-8.Partes: Autor: Defensoria Pública da União.Réus: Instituto Nacional do Seguro Social.ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO. LEGITIMIDADE ATIVA CONFIGURADA. ADEQUAÇÃO DA AÇÃO. AUXÍLIO-DOENÇA. COBERTURA PREVIDENCIÁRIA ESTIMADA. DATA DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. ALTA PROGRAMADA. ILEGALIDADE. IRRAZOABILIDADE. SUSPENSÃO DO BENEFÍCIO. NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE PERÍCIA MÉDICA QUE DEMONSTRE A CAPACIDADE LABORAL DO SEGURADO. ANTECIPAÇÃO DA TUTELA DEFERIDA. Decisão:Vistos etc. Ingressa a Defensoria Pública da União com Ação Civil Pública em face do Instituto Nacional do Seguro Social, para o fim de garantir aos cidadãos o direito a continuidade da percepção do auxílio – doença até resultado final de nova perícia em que se verifique a real condição de saúde do segurado para determinar se ele teria ou não condição de retornar ao seu trabalho. Informa que a suspensão do benefício percebido pelo segurado, antes de realizada a perícia necessária, macula o ato administrativo correspondente, que deve resultar de processo administrativo, regulado pela Lei nº 9.784/99, configurando flagrante desrespeito aos princípios da legalidade, da dignidade da pessoa humana, do contraditório e da ampla defesa, do direito à saúde e do direito à previdência social. Aduz, ainda, que somente é permitido ao segurado beneficiário solicitar nova perícia 15 (quinze) dias antes da cessação do benefício; prazo esse, insuficiente para que se ultime as providências necessárias à manutenção da prestação securitária. Salienta que a “alta programada” atende mais aos interesses da Administração para racionalizar o serviço e para economizar recursos, em prejuízo do segurado que tem cessado o seu benefício antes da sua total reabilitação. Enfatiza que “o reconhecimento da ilegalidade normativa do Decreto nº 5.844/06, seja por não atender aos requisitos formais para a sua edição, seja por ser materialmente contrário às disposições da Lei 8.213/91 e da própria Constituição Federal, é medida que se impõe para a construção de uma sociedade livre, justa e solidária (CF art. 3º, inc.I)”. Requer o autor: “1) A citação do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, na pessoa do procurador federal responsável, para, querendo, oferecer resposta à presente ação. 2) O deferimento da antecipação dos efeitos da tutela para determinar que o réu cesse a prática ilegal denominada de “Data de Cessação de Benefício – DCB” ou “Alta Programada” -, prevista no Decreto 5.844/06, promovendo-se a obrigação de não fazer consistente no impedimento da suspensão dos benefícios previdenciário auxílio-doença antes da constatação do efetivo fim da incapacidade laborativa do segurado beneficiário, através do agendamento de nova perícia médica, nos casos existentes nas agências e postos situados nos Estados integrantes do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (ou ao menos no Estado de Sergipe), respeitando-se, assim, o contraditório e a ampla defesa, atribuindo-se multa diária, para a hipótese de descumprimento total ou parcial do provimento, no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), a ser depositada em conta bancária aberta por esse MM. Juízo (art.13, parágrafo único, da LACP). 3) Na hipótese de descumprimento da decisão liminar, seja imputada multa ao agente recalcitrante, no caso, o representante legal do INSS, por ato atentatório à dignidade da Justiça, na forma do art. 14, inc. V, c/c parágrafo único, do Código de Processo Civil. 4) A intimação do Ministério Público Federal, nos termos do artigo 5º, § 1º, da Lei 7.347/85. 5) Seja, ao final, confirmada a medida liminar deferida e julgado PROCEDENTE o pedido, a fim de cessar, em definitivo, por ilegal, a prática “data de cessaçãodebenefício (DCB)” ou “alta programada”, bem como na obrigação de fazer consistente no agendamento de perícia médica visando a constatação do efetivo fim daincapacidade do segurado beneficiário, nos casos existentes nas agências e postos situados nos Estados integrantes do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, ou ao menos no Estado de Sergipe.” Junta documentos de fls. 24 a 63. O Instituto Nacional do Seguro Social apresenta impugnação1, nos termos do art. 2º, da Lei nº 8.437/92. Alega, preliminarmente, a ilegitimidade ativa da Defensoria Pública da União e a inadequação da via eleita, pois que o direito previdenciário é direito individual homogêneo disponível e sem relação de consumo, não abrigado pela Lei da Ação Civil Pública ou pelo Código de Defesa do Consumidor. Ressalta que se objetiva com o sistema COPES - Cobertura Previdenciária Estimada redefinir diretrizes de atuação da Perícia Médica; conferir maior resolutibilidade na concessão de benefícios por incapacidade; liberar vagas nas agendas médicas; reduzir a demanda por exames nas unidades do INSS; conferir agilidade no atendimento ao segurado; reduzir custos causados pela ineficiência; reduzir filas; inibir a ação de agenciadores, reduzir fraudes; uniformizar condutas por meio de capacitação continuada; facilitar o gerenciamento da Perícia Médica; e melhorar a imagem da Instituição.2 O INSS traça um resumo da sistemática para a concessão/denegação/cessação/prorrogação do benefício por incapacidade laborativa no sistema COPES - Cobertura Previdenciária Estimada – antes e depois da Orientação Interna nº 138/INSS/DIRBEN. Afirma que: 1) não há limite para cessação do benefício, cujo termo é estabelecido pelo médico perito, o que será feito em função das características clínicas de cada doença; 2)”somente será cabível a interposição do PP3 nas hipóteses em que a Data da Cessação do Benefício – DCB – for maior que a Data da Realização do Exame – DRE4.”; 3) “O prazo para interpor o PP é de 15 dias até a Data da Cessação do Benefício – DCB”5. 1 Fls. 66/86. 2 Fls. 71. 3 Pedido de Prorrogação. 4 Fls. 74. 5 Fls. 74.Assevera que a Previdência Social não é um órgão de Assistência Médica, não lhe cabendo fazer diagnósticos, realizar tratamentos nem tampouco “dar alta” ao paciente, mas estimar os prazos que serão necessários a recuperação do paciente, embasada em longos estudos probabilísticos das doenças mais incidentes. Pede a improcedência do pedido. Junta os documentos de fls. 87/88. O INSS requer a designação de audiência prévia para esclarecer detalhadamente o funcionamento do sistema COPES e os prejuízo que poderão ser gerados em caso de deferimento da tutela antecipada requerida.6. Em seu Parecer7, o Ministério Público Federal posiciona-se favorável ao pleito autoral, pugnando “pela total procedência dos pedidos aduzidos na peça vestibular, para que seja determinada a cessação do sistema de “Alta Programada”, de sorte que a concessão do benefício do auxílio-doença só possa findar mediante conclusão de nova perícia médica que ateste a capacidade laboral.”8. É O BREVE RELATO. DECIDO. I. DA PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE ATIVA Não merece acolhimento a preliminar suscitada pelo réu, a teor do que prescreve o art. 5º, da Lei nº 7.347/85: 6 Fls. 90/96.7 Fls. 98/106. 8 Fls. 105/106. Na hipótese dos autos, o direito deduzido em Juízo amolda-se àqueles caracterizados pelo interesse social e coletivo, que pode e deve serpatrocinado pela Defensoria Pública da União, vez que alcança um número ilimitado de pessoas, evitando a propositura de um número imenso de demandas, com o congestionamento do Poder Judiciário e a lentidão no desate das causas, com prejuízo para as partes. Rejeito a preliminar. II. DA INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. Igualmente, não merece prosperar a alegação de inadequação da via eleita. porquanto a Defensoria Pública da União está autorizada a propor ação civil pública que vise a defesa de direitos sociais, coletivos, inclusive de natureza securitária, não havendo óbice a que a pretensão deduzida em Juízo seja veiculada nesta ação especial, cujo resultado poderá ter maior efetividade e abrangência que outras ações previstas na lei processual. Versa a lide sobre a defesa do direito social coletivo, e não de relação de consumo, pois, como bem disse o douto Procurador da República em seu Parecer: Rejeito, também, esta preliminar. II. DO MÉRITO. Nessa seara, não é razoável a fixação de prazo para a fruição do benefício auxílio-doença, sob pena de se pôr em risco a sobrevivência dos beneficiários e a de suas famílias, tanto que os arts. 59 e 60 da Lei nº 8.213/91 assim determina: No mesmo passo, assim determina o art. 78 do Decreto nº 3.048/99, que regulamenta as Leis nos 8.212/91 e 8.213/91:Assim, para que o auxílio-doença seja suspenso ou cesse, deve ser verificado se o beneficiário encontra-se capacitado para o trabalho, através da devida perícia, o que cumpre ao INSS er de forma contundente e não por mera presunção. Sob outro ângulo, não prospera o argumento de que o segurado pode solicitar exame médico-pericial se não estiver apto para o trabalho ao término do prazo de duração do auxílio-doença, tendo em vista que é dever da Autarquia Previdenciária convocar o segurado para a submissão ao exame, e não o contrário. Posto isso, concedo a tutela antecipada requerida para determinar ao réu que cesse a prática ilegal denominada de “Data de Cessação de Benefício DCB – ou de “Alta Programada”, prevista no Decreto nº5.844/06, não suspendendo os benefícios previdenciários do auxílio-doença antes da constatação do efetivo fim da incapacidade laborativa do segurado beneficiário, através do agendamento de nova perícia médica, nos casos existentes nas suas agências e postos situados nos Estados integrantes do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, impondo a multa diária de R$ 1.000,00 (hum mil reais reais) caso haja descumprimento ainda que parcial desta decisão. Intime-se o réu para cumprir esta decisão, citando-o, em seguida, para responder a ação, no prazo legal. Aracaju, 5 de fevereiro de 2009. Juiz Edmilson da Silva Pimenta”.
Fonte: http://www.jfse.jus.br/noticiasbusca/noticias_2009/fevereiro/decisaoauxilodoenca.pdf

(*) Luiz Salvador é Presidente da ABRAT (www.abrat.adv.br), Vice-Presidente da ALAL (www.alal.la), Representante Brasileiro no Depto. de Saúde do Trabalhador da JUTRA (www.jutra.org), assessor jurídico da AEPETRO e da ATIVA, membro integrante do corpo técnico do Diap e Secretário Geral da CNDS do Conselho Federal da OAB, e-mail: luizsalv@terra.com.br, site: www.defesadotrabalhador.com.br

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